Uma pesquisa inédita, que ouviu mais de 46.000 pessoas em todos os
estados do país, chega a uma conclusão preocupante para a saúde dos brasileiros:
a atividade esportiva é restrita a homens jovens e com alto poder aquisitivo.
Revista Veja - por Otávio Cabral e Guiliana Bergamo.
O Brasil é um país de
preguiçosos. A pequena parcela da população com disposição de calçar um par de
tênis para se exercitar é formada majoritariamente por homens jovens e com alto
poder aquisitivo. O futebol é, disparado, o esporte mais praticado, seguido por
corrida e caminhada. Essas são as principais conclusões dá maior pesquisa já
feita sobre os hábitos esportivos dos brasileiros. Os resultados preocupam. É
indiscutível que a prática de esportes, associada a urna alimentação regrada,
está diretamente ligada a uma vida mais saudável. Estudos recentes deixaram
ainda mais evidente essa relação. Quem se exercita regularmente aumenta a
expectativa de vida, reduz o risco de morte por infarto e derrame e combate a depressão e o stress.
O Estudo sobre Prática
de Esportes foi conduzido por um ano pela filial brasileira da Spon+Markt,
empresa alemã com 25 anos de mercado e presença em 120 países. Foram ouvidas
46308 pessoas a partir de 16 anos, em 130 cidades com mais de 200 000
habitantes de todos os estados. Dos entrevistados, 62% disseram jamais praticar
atividade física. O índice é bem maior entre as mulheres do que entre os
homens. "É uma questão social. A maioria das mulheres precisa trabalhar
fora e também cuidar da casa. Essa dupla jomada dificulta a prática de
esportes", afirma Cesar Gualdani, presidente da Sport+Markt. A faixa
etária e a classe social também são fatores determinantes. "Os jovens de
maior renda têm mais informação sobre os benefícios da atividade física e mais
acesso a clubes, parques e academias. Além disso, passam menos horas presos no
trânsito - ou seja,encontram tempo e disposição para se exercitar", explica
Gualdani.
A pesquisa traçou ainda
um mapa da prática de esportes no Brasil. Poder aquisitivo e questões culturais
explicam as modalidades favoritas de cada região. Porto Alegre e Florianópolis,
locais de alto padrão de renda, são as cidades onde a população mais se
exercita. Já Recife é a capital do sedentarismo. Pelos mesmos motivos, os
brasileiros se mexem mais do que habitantes de países pobres da América Latina,
África e Ásia. Mas bem menos do que europeus, japoneses e americanos. O Rio de
Janeiro; com as suas praias e a tradição de seus times, é a capital do futebol.
Brasília, plana e cheia de parques, é onde mais se corre. A prática de cada
modalidade cresce quando há ídolos que nela se destacam. O tênis teve um boom
com Gustavo Kuenen na década passada. O basquete, antes a segunda modalidade
na preferência do país, hoje tem um quarto dos praticantes do vôlei - reflexo
dos últimos quinze anos. O basquete não tem um ídolo desde a aposentadoria de
Oscar Schmidt nem ganhou campeonatos. Já o vôlei coleciona títulos mundiais e
olímpicos no masculino e no feminino.
A saúde aparece como o
principal motivo para a procura por atividades físicas. "Antigamente,
esporte era sinônímo de lazer. Agora passou a refletir a preocupação com saúde
e estética", afirma Gualdani. Justifica-se. Todo ano, 3,2 milhões de
pessoas morrem no mundo porque são sedentárias. No ranking da Organização
Mundial de Saúde dos principais fatores de risco para as causas mais comuns de
morte, como infarto e derrame, o sedentarismo figura na quana posição, atrás
apenas de diabetes, tabagismo e hipertensão. "O corpo humano foi feito
para se mexer", diz o físiologista Paulo Zogaib, da Universidade Federal
de São Paulo. "Em movimento constante, nosso organismo realiza melhor
todas as suas funções. Parado, adoece." A prática regular de atividades físicas tem o poder de mitigar o efeito
do envelhecimento . Um estudo publicado na revista científica The
Lancet mostrou que apenas quinze minutos diários de exercícios, ou uma
hora e meia por semana, são suficientes para aumentar a expectativa de vida em
três anos e diminuir em 14% o risco de morre súbita. Isso ocorre porque,
quando nos exercitamos, aumentamos a capacidade de órgãos vitais, como o
pulmão e o coração. Dessa forma, mais oxigênio e sangue são transportados por
todos os tecidos, aperfeiçoando suas funções. Ao mesmo tempo, o gasto calórico
diminui os níveis de colesterol ruim, eleva os de colesterol bom, faz subir o
número de linfócitos (células responsáveis por combaterr vírus e bactérias) e
ainda ajuda a controlar a depressão, a falta de memória e outros efeitos do
cansaço mental.
O Colégio Americano de
Medicina Esportiva tem uma receita mais rigorosa para quem quer extrair os
benefícios máximos da atividade física. A recomendação é praticar 150 minutos
semanais de modalidades aeróbicas, como caminhar (rápido), correr, nadar ou
pedalar, e duas sessões de exercfcios de força que trabalhem a maior parte dos
músculos do corpo, como musculação. O programa deve, ainda, contemplar
impacto e agilidade, como ocorre em esportes de quadra; flexibilidade, presente
na ioga e em aulas de alongamento; e equilíbrio, próprio da dança e do surte.
Tal rotina, entretanto,
não deve ser excedida, sob o risco de causar mais danos do que benefícios.
"Tão fundametal quanto manter a aregularidade é evitar as lesões",
afirma o médico Victor Matsudo, do Centro de Estudos do Laboratório de Aptidão
Física de São Caetano do Sul. Quem vai além do limite em esportes de impacto,
por exemplo, está sujeito a fraturas e dores crônicas. é o caso da economista
Lara Curvello Altasim. Há dois anos, ela tomou gosto pela corrida e, em poucos
meses, já fazia teinos de 9 quilômetros. Foi quando, no fim de semana de uma
prova mais longa de 10 quilômetros, sentiu dores fortes. Ela machucara um de
seus joelhos. O exagero lhe custou três meses de caminhadas leves e tratamento
médico. "Hoje, não passo do meu limite", afirma. Quem pega pesado
també deflagra uma produção acima do normal de radicais livres, as
moléculas tóxicas que danificam as células e aceleram o envelhecimento, e pode
ainda sofrer uma baixa no sistema imunológico, o que desencadeia gripes e
infecções. A receita ideal, portanto, é se exercitar sempre, mas sem exagero.
• 7 mitos sobre o
exercício físico
1 - Caminhada não é
atividade física
"Atividade física
é qualquer movimento decorrente de contração muscular com gasto energético
superior ao do repouso", diz o médico do esporte Victor Matsudo. A
caminhada é, portanto, uma atividade física. Seus benefícios, porém, só começam
a ser sentidos quando ela é praticada num ritmo de 4 a 7 quilômetros por hora.
2 - lsotônicos são
sempre a melhor opção para repor os minerais perdidos com a atividade física
Isotônicos são
indicados apenas para pessoas que praticam exercícios de longa intensidade
e duração, em geral, acima de duas horas. Em atividades mais breves, a
perda de sódio e potássio pode ser reposta com água.
3 - Ioga não é um
exercício aeróbico
Exercícios aeróbicos
são aqueles que aumentam a frequência cardíaca por mais de três minutos. As
atividades aeróbicas por excelência são aquelas que mantêm os batimentos
cardíacos entre 50% e 85% da frequência cardíaca máxima (FMC). Para calculá-Ia,
subtraia sua idade de 220. Se você tem, por exemplo, 40 anos, sua FCM é 180
batimentos por segundo. Durante a atividade, essa taxa deve ficar entre 90 e
153. Na ioga tradicional, chamada de hatha, prevalecem os exercícios de
flexibilidade e equilíbrio. As modalidades mais vigorosas, como power ioga eashtanga,
podem ser consideradas aeróbicas.
4 - Sentir dores
fortes pelo corpo é sinal de que os exercícios praticados fizeram efeito
Dores leves que duram,
no máximo, dois dias depois da prática de uma nova modalidade ou de exercícios
feitos com maior vigor indicam pequenas rupturas nas fibras musculares - o que
estimula a regeneração e o nascimento de novas fibras. Dores mais fortes e de
longa duração são sinal de que houve lesão e precisam ser investigadas.
5 - A prática da
corrida favorece uma aparência mais envelhecida
Qualquer atividade
física, a corrida inclusive, quando praticada de forma exagerada, deflagra
uma produção excessiva de radicais livres. Isso acelera o processo de
envelhecimento, causando flacidez.
6 - A natação é a mais
completa das atividades físicas
Não existe uma
atividade física que contemple todas as recomendações do Colégio Americano de
Medicina Esportiva, o principal guia da área. O ideal é praticar mais de uma
modalidade, de modo a combinar os principais benefícios dos exercícios físicos:
capacidade aeróbica, agilidade, equilíbrio, flexibilidade, força e impacto.
7 - Exercícios
vigorosos, que queimam muitas calorias em pouco tempo, são os mais indicados
para programas de emagrecimento
Em geral, atividades
vigorosas são indicadas para ganho de força. Quando os exercícios são demasiado
puxados, é difícil fazê-los por muito tempo. As atividades moderadas podem ser
mantidas por períodos mais longos e, por isso, são ideais para quem quer
emagrecer.